E quando um jogo ultrapassa todas as expectativas. Mesmo
sendo no mínimo diferente?
Chamar jogo a Journey seria insultuoso para o trabalho
levado a cabo pela thatgamecompany. Não que não o seja mas porque apenas seria
uma descrição limitadora. Jenova Chen, o líder do estúdio, acredita que criou
novamente uma inspiradora experiência interativa sobre as capacidades do ser
humano, neste caso provavelmente na capacidade para se ultrapassar e de
ascender a algo mais. Journey parece mais um exercício introspetivo sobre a
forma como o ser humano se aventura perante o desconhecido, talvez mais sobre
como tal não acontece tanto quanto noutras eras da humanidade, sobre o estímulo
e desafio que daí resulta. Por outro lado estamos numa atualidade em que os
videojogos ambicionam algo mais, algo com mais substância, mas um contraste
parece evidenciar-se quando mais parece que estamos a viver numa era de
"fast-gaming", quase um equivalente do que o fast-food representa
para a alimentação.
E se pudéssemos parar, parar de correr ou parar para pensar e desfrutar do momento sem presunções e acreditar que este nosso passatempo pode ser a porta para algo mais do que a diversão direta e, frequentemente, banal que vamos tendo nos dias de hoje? E se no meio de tanto caos, no meio de tanto tiro ou soco desferido que nos faz sentir tanta emoção e serve como fuga tivéssemos tempo para desfrutar de uma experiência que nos faz parar e pensar em nós, em algo mais profundo do que o prazer imediato? Se tal conseguir o seu propósito poderemos então ter os videojogos a o serem mas a ascenderem a algo mais que diversão imediata, e talvez seja aí que reside a porta para o grande debate sobre se os videojogos podem tornar-se arte.
Agora podemos perguntar qual o propósito de uma jornada? Provavelmente encontrar algo que não estava acessível no momento da partida. Descobrir algo que nos faça ultrapassar limites do estado atual ou então descobrir significados que estavam fora do nosso alcance. Quase sempre o percurso tem tanto ou mais significado que o objetivo final e o que aprendemos pelo caminho é tão valioso quanto o final. Agora podemos perguntar qual o propósito de um videojogo? A resposta é bem mais simples e direta: entreter e divertir, algo que contrasta fortemente com o envolvimento espiritual e humano que uma jornada pode alcançar. E se fosse possível combinar os dois e pelo meio ainda insinuar-se como algo que poderia ser considerado como arte?
Journey é então assim algo estranho, algo que não se parece como um jogo no seu sentido tradicional mas que na verdade o é.
Não existem as atuais indicações que dizem ao jogador quais os processos que devem obedecer e quais as restrições a que está sujeito, aqui é como se pedissem ao jogador, define tu o que tens à tua frente. Nos primeiros momentos com Journey fiquei mesmo como que desamparado, sem saber o que pensar do jogo e sem saber o que era suposto eu pensar. É precisamente isso que a thatgamecompany pretende, que o jogador deixa a postura de "vou fazer isto e aquilo porque um tutorial disse para fazer" para que o jogador verdadeiramente descubra o jogo por si e aprenda as bases por si.Mais sobre Journey
Journey não tem praticamente texto nenhum, não tem falas, e
não tem quaisquer barras que digam ao jogador que vai ser penalizado se adotar
determinado comportamento.
Não, aqui temos uma jornada que começa apenas com três indicadores: o personagem que surge no meio de um deserto, um luz que brilha ao fundo da colina e uma enorme montanha bem lá no fundo e que claramente acreditámos ser o nosso destino.
Mais uma vez a estrutura que o estúdio parece adorar é usada com belo efeito, a estrutura de um passo de cada vez, de uma ação leva à outra e de que cada ato é parte de uma sequência que se desenrola por ação do jogador.
Não, aqui temos uma jornada que começa apenas com três indicadores: o personagem que surge no meio de um deserto, um luz que brilha ao fundo da colina e uma enorme montanha bem lá no fundo e que claramente acreditámos ser o nosso destino.
Mais uma vez a estrutura que o estúdio parece adorar é usada com belo efeito, a estrutura de um passo de cada vez, de uma ação leva à outra e de que cada ato é parte de uma sequência que se desenrola por ação do jogador.
Ao chegar à colina o jogador vê que a luz lhe concede a
capacidade para saltar mas apenas o pode fazer uma vez, até que encontre
novamente determinados objetos que lhe permitam saltar outra vez.
Este é uma das mecânicas gameplay mais básicas de Journey e provavelmente aquela que mais o aproxima dos mecanismos tradicionais de um videojogo.Tal como a thatgamecompany nos habituou, primeiro chegamos à colina para obter a capacidade de saltar, em seguida já vemos uma construção lá ao fundo e temos que viajar pelo deserto até lá chegar e aí já vemos uma nova construção, com a enorme montanha sempre lá presente no horizonte.
Este é uma das mecânicas gameplay mais básicas de Journey e provavelmente aquela que mais o aproxima dos mecanismos tradicionais de um videojogo.Tal como a thatgamecompany nos habituou, primeiro chegamos à colina para obter a capacidade de saltar, em seguida já vemos uma construção lá ao fundo e temos que viajar pelo deserto até lá chegar e aí já vemos uma nova construção, com a enorme montanha sempre lá presente no horizonte.
"Para um estúdio que pretende focar-se mais nas
sensações que quer transmitir ao jogador, deve ser um enorme prazer sentir que
criou algo tão mágico quanto Journey."
Nesta nova construção descobrimos que podemos interagir com
determinados elementos dos cenários, aqui uma espécie de altar que conta
pedaços de uma história que só mais tarde irá fazer sentido. Daí vemos enormes
ruínas no meio do deserto nas quais temos que libertar pequenos objetos, que
parecem tapetes, que nos permitem saltar mais alto e recarregam a capacidade
para saltar. Aqui também temos a oportunidade para alcançar determinados
objetos que nos permitem saltar por mais tempo e ficam gravados no nosso
"cachecol" que vai crescendo em acordo. Após alcançarmos o altar
final, ficamos no que pode ser considerado o final do nível e seguimos jornada
para um novo cenário.
Esta é a estrutura de Journey, vários locais pelos quais
viajamos e cujos obstáculos temos que ultrapassar. Por razões óbvias não vamos
aqui alargar muito sobre este elemento, é delicioso descobrir cada novo passo
desta jornada e a momentos conseguimos ser bem mais do que surpreendidos.
Journey pede ao jogador que embarque nesta viagem e vá ultrapassando os
desafios físicos destes locais e que vá aprendendo aos poucos que não está aqui
para alcançar melhor lugar nas tabelas de pontuações ou para obter determinado
objeto, que está aqui para descobrir uma jornada e simplesmente isso.
Para um estúdio que pretende focar-se mais nas sensações que
quer transmitir ao jogador, deve ser um enorme prazer sentir que criou algo tão
mágico quanto Journey.
Inspirador e até quase com uma certa inocência a nos desarmar de preconceitos. Também marcante na experiência é a forma como o personagem se move, repleto de graciosidade na maioria dos momentos mas em acordo com as dificuldades específicas de determinados locais.
Journey consegue estabelecer uma bela ligação entre a fantasia e o credível. Em alguns momentos temos um personagem que voa pelos cenários e mais parece que estamos a viver algo envolto na magia dos filmes de menino mas noutros estamos a ser alvo das físicas a que toda a humanidade está. Desde os movimentos pela areia ao longo do deserto, à subida de degraus e do cálculo da distância para os saltos, existem mecânicas em Journey que temos que seguir mas que nesta experiência se sentem tão leves que se tornam naturais e quase sentimos que nem existem.
Inspirador e até quase com uma certa inocência a nos desarmar de preconceitos. Também marcante na experiência é a forma como o personagem se move, repleto de graciosidade na maioria dos momentos mas em acordo com as dificuldades específicas de determinados locais.
Journey consegue estabelecer uma bela ligação entre a fantasia e o credível. Em alguns momentos temos um personagem que voa pelos cenários e mais parece que estamos a viver algo envolto na magia dos filmes de menino mas noutros estamos a ser alvo das físicas a que toda a humanidade está. Desde os movimentos pela areia ao longo do deserto, à subida de degraus e do cálculo da distância para os saltos, existem mecânicas em Journey que temos que seguir mas que nesta experiência se sentem tão leves que se tornam naturais e quase sentimos que nem existem.
Journey partilha o seu destaque com o jogador e faz-nos
sentir que mais do que estarmos a ser conduzidos ao longo de uma experiência
interativa somos o principal e máximo interveniente. No entanto, a determinado
momento podem notar uma figura similar à vossa a saltitar pelos cenários.
É mais uma forma da thatgamecompany provar que nada de intrusivo existe aqui e que estamos nada mais, nada menos, do que perante o modo cooperativo.
Ocasionalmente podemos entrar no jogo de outros, ou ser visitados, e novamente não podemos deixar de elogiar a forma como o estúdio brinca com as sensações que o desconhecido pode provocar, estranheza e até medo inicial que não deixa de provocar interesse e de aguçar alguma curiosidade.
É mais uma forma da thatgamecompany provar que nada de intrusivo existe aqui e que estamos nada mais, nada menos, do que perante o modo cooperativo.
Ocasionalmente podemos entrar no jogo de outros, ou ser visitados, e novamente não podemos deixar de elogiar a forma como o estúdio brinca com as sensações que o desconhecido pode provocar, estranheza e até medo inicial que não deixa de provocar interesse e de aguçar alguma curiosidade.
Esta é a forma como o modo cooperativo surge em Journey, sem
interrupções, sem pausas, sem quaisquer elementos que quebrem esta encantada
jornada. Como referido, nada aqui é intrusivo, nada é forçado, o jogador vive a
sua jornada. Isto reflete-se nesta componente quando temos a possibilidade de
trabalhar em conjunto com o outro jogador ou simplesmente deixar que viva a sua
experiência e seguir a nossa. Podem mesmo terminar a experiência toda em
conjunto e podem também conhecer vários jogadores ao longo da vossa jornada,
está tudo entregue a vocês.
Um dos maiores apelos de Journey é sem quaisquer dúvidas o
seu visual. Mais do que o jogo de cores, que dão imensa personalidade e
distinção a cada um dos locais e cenários que se desenrolam à nossa frente, é a
forma como o estúdio joga e embrulha em mistério cada novo metro do percurso.
Para uma jornada que pretende refletir sobre o desbravar do desconhecido pela
humanidade, é incrível a forma como o estúdio consegue rodear de mistério cada
um destes locais nos quais cada novo desafio, cada nova sala, cada nova
construção nos arrebata pela sua arquitetura e pelo seu design. O mundo aqui
criado pela thatgamecompany é tão simples que espanta como consegue ser tão
lindo e como nos consegue cativar tanto e nos fazer acreditar ter tanto
significado.
Qualquer um que tenha jogado flOw ou flOwer sabe que a
thatgamecompany investe seriamente na forma como a componente sonora entra em
sintonia com todo o aparato visual. Aqui em Journey tal volta a ser usado e as
misteriosas músicas estabelecem um ambiente fantástico que ajuda bastante na
imersão do jogador.
Simples e misteriosa quanto toda a jornada em si, a música de Journey convive com vários efeitos sonoros que nos fazem acreditar estar num mundo de fantasia próprio e seu. Um feito bem digno e merecedor de grande apreço.
Simples e misteriosa quanto toda a jornada em si, a música de Journey convive com vários efeitos sonoros que nos fazem acreditar estar num mundo de fantasia próprio e seu. Um feito bem digno e merecedor de grande apreço.
Por muito que se queira fantasiar e divagar, seja de que
forma for, Journey está inserido na categoria de videojogo e como tal alguns
vão sentir a forçosa necessidade de o medir dentro de padrões da indústria.
Nesta jornada mística e emblemática, a sua longevidade pode ser o elemento que
menos vai agradar aos jogadores pois para chegarmos ao final é preciso pouco
mais do que um par de horas. No entanto, tal nem sequer arranha o valor de
Journey pois para além dos cativantes troféus que ficam por fazer, sem dúvida
que o convite a repetir a jornada é mais do que irresistível.
Journey é realmente uma jornada espantosa do princípio ao
fim. Extremamente linda e com significados que vão diferenciar dependendo da
interpretação do jogador. É algo único e simplesmente irresistível, digno de
ser jogado por todos com acesso à PSN.
Se alguns insistem em aclamar que os videojogos são uma forma de arte, então a thatgamecompany mostra definitivamente um argumento de peso para quem defende tal. A sensação estranha que inicialmente fica enquanto somos desarmados pela sua simplicidade rapidamente se torna em algo prazeroso que se entranha e ficamos apaixonados por algo belo e mágico.
Se alguns insistem em aclamar que os videojogos são uma forma de arte, então a thatgamecompany mostra definitivamente um argumento de peso para quem defende tal. A sensação estranha que inicialmente fica enquanto somos desarmados pela sua simplicidade rapidamente se torna em algo prazeroso que se entranha e ficamos apaixonados por algo belo e mágico.
Fonte: Eurogamer
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